domingo, 5 de janeiro de 2014

Caso 054: Isolamento Térmico NÃO previne a Corrosão.

Um dos problemas mais sérios e comuns em unidades industriais que possuem tubulações e equipamentos isolados é a corrosão sob o isolamento ou Corrosion Under Insulation (CUI). Esta é uma corrosão eletroquímica que evolui silenciosamente sob o isolamento térmico ou materiais de proteção passiva (fireproofing), como o concreto, com uma taxa de corrosão acelerada quando comparada a taxa que ocorre em tubulações sem isolamento expostas a atmosfera (sistema aberto). 

Linha corroída devido infiltração de
umidade através do isolamento térmico.

O isolamento e o fireproofing torna-se uma “capa” para a corrosão se esconder e o meio ambiente adequado para se iniciar e desenvolver. Esta cobertura retêm umidade ou produtos químicos e criam condições para o ataque corrosivo. Por estar oculto, este processo geralmente se desenvolve sem ser percebido por muitos anos e pode resultar em falha.
Além de ser comum em tubulações, ocorre em tanques, ou outros equipamentos onde isolamento térmico deficiente (mal instalado) ou danificado permite a entrada de água, escondendo o mecanismo de deterioração sob o isolamento, não permitindo que você o note.

CUI no costado de um tanque de armazenamento.

Os materiais isolantes se não estiverem bem protegidos mecanicamente e selados contra a entrada de umidade tendem a absorver uma quantidade significativa de água, para se ter uma ideia, um dos materiais isolantes mais utilizados na indústria para serviços com temperatura acima da temperatura ambiente é o silicato de cálcio, este material é altamente higroscópico, ele absorve entre 10-14% do seu volume em água. Ver uma tabela retirada do artigo “Corrosion: understanding the basics” por Joseph R. Davis (ASM International 2000) comparando alguns materiais isolantes.




Sob o isolamento cria-se um sistema fechado que mantém a presença de umidade até 175 °C, ou seja, a evaporação da água oxigenada é limitada, o que promove uma maior taxa de corrosão devido a temperatura mais alta, conforme pode ser visto gráfico abaixo adaptado do trabalho de Speller, Corrosion – Causes and Prevention, 1935, Mcgraw-Hill.



OBS: A literatura técnica  sugere que a CUI pode ser uma preocupação para equipamentos operando em temperaturas entre  4°C e 175°C, porém a pratica revela que é bastante comum sua ocorrência com temperaturas  até 120°C.

Esta umidade absorvida pode vir da chuva, sistema provisório de resfriamento (jato d’água) ou de equipamentos como torres de refrigeração que associados a contaminantes com presença de cloreto e enxofre (chuva ácida) promove uma corrosão ainda mais acentuada, em especial nos aços inox austeníticos (série 300) levando a outros mecanismos de corrosão fraturante como a corrosão sob tensão (stress cracking corrosion).
Como todo este processo  ocorre “escondido” da inspeção visual, sua detecção na maioria das vezes só ocorre com a presença de vazamento. Esta ação silenciosa a torna uma das mais perigosas.

Imagem retirada de um guideline que trata da CUI desenvolvido
pela National Association of Corrosion Engineers - NACE,
com a colaboração da Exxon, Shell, BP entre outras.

A dificuldade no controle da CUI é a garantia da impermeabilidade/vedação da estrutura de proteção do isolamento devido aos seguintes fatores:
  • As irregularidades geométricas e a própria vida útil dos materiais selantes que tendem sempre a ressecar e permitir passagem;
  • Pela própria necessidade de acompanhar a vida útil das tubulações através de medição de espessura, sempre ocorre à necessidade de abrir janelas de inspeção que levam a entrada da umidade, e se não forem feitas recompostas corretamente deixam “brechas”;
  • Pontos “mortos” da tubulação como drenos e vents sempre tem sua temperatura abaixo da condição máxima e estes pontos são sempre os mais susceptíveis a entrada de umidade;
  • Materiais de isolamento térmico típicos de sistemas de alta temperatura, como o silicato de cálcio, são altamente higroscópicos, e isto pode ocorrer durante a instalação/montagem se não tomados os devidos cuidados e durante a operação nas “brechas” citadas acima.

Alguns fatores contribuintes para a CUI incluem:
  • Água presente no isolamento, por causa de armazenamento impróprio antes da instalação imprópria, ou danos após a instalação do isolamento. Isso pode ser agravado se houver contaminação química da água embebida no isolamento – por exemplo, por ácidos e outros químicos, ou cloretos, tais como o sal presente no ar próximo a água salgada ou por produtos químicos provenientes de degelo;
  • A CUI pode ocorrer em regiões mais afastadas do ponto real de vazamento – especialmente em pontos mais baixos. Você pode estar vendo um vazamento pelo isolamento, mas não necessariamente o ponto real de vazamento na tubulação;
  • Pequenos orifícios ou pequenos vazamentos a partir de juntas e conexões sob o isolamento podem permanecer não detectados até que o dano cause um grande vazamento.

Isolamento danificado facilita a infiltração de água.


EXEMPLOS DO QUE PODE ACONTECER
  • Um tubo de 4” contendo amônia líquida vazou por causa de corrosão extensiva. A qualidade do isolamento era ruim permitindo a entrada de água através do isolamento. A tubulação tinha sido parcialmente inspecionada durante a última parada, mas essa seção de tubulação em particular não havia sido examinada.
  • Uma tubulação de 1” de alimentação de gás inflamável se rompeu por causa da perda de espessura do tubo devido à corrosão sob o isolamento, causando um incêndio. Era uma tubulação de by pass que de fato não estava em operação na ocasião. Por não haver fluxo através da tubulação, ela estava mais fria que a tubulação principal (cerca de 80° C). Essa temperatura era baixa o suficiente para fazer condensar vapor ou a umidade do ar. A água na forma líquida, em contato com o tubo com isolamento, não evaporava rapidamente. Isso, em combinação com o isolamento danificado, criou as condições que tornaram mais favorável o aparecimento de corrosão.
  • A foto abaixo mostra corrosão externa em linha de transferência de fenol. A linha era isolada e falhou antes da corrosão ser descoberta. Embora ninguém tenha se ferido, foi muito custoso corrigir os danos ambientais e reparo da tubulação.

Linha de fenol "atacada" pela CUI.




O QUE PODE SER FEITO

1. Saber quais estruturas e equipamentos no seu processo que tenham potencial para corrosão sob o isolamento. Veja abaixo os itens apontados pelo API-570 (Piping Inspection Code: In-service Inspection, Rating, Repair, and Alteration of Piping Systems) e a NACE-198:

a.  Aquelas áreas expostas ao gotejamento de torres de refrigeração;
b.  Aquelas expostas a vents de vapor;
c.  Aquelas expostas a gotejamento de misturas ou vapores ácidos;
d.  Sistemas de tubulação em aço carbono e baixa liga isoladas, incluindo isolamento para proteção pessoal, operando entre  4°C a 175°C ou serviços intermitentes;
e.   Acima de 175°C, quando trabalham com serviços intermitentes;
f.   Linhas de vent e dreno com trechos “mortos” que trabalham em temperaturas inferiores a temperatura da linha principal;
g.  Tubulações de aço inox que operam entre 60°C e 205°C, sujeitas a presença de cloreto;
h.  Sistemas sujeitos a vibração que está susceptível a danificar o isolamento criando caminho para entrada de água;
i.  Outros sistemas que o isolamento esteja susceptível a dano.

Em muitos casos podemos observar  o estufamento do isolamento térmico
quando o óxido "empurra" o mesmo devido seu aumento de volume.

2.   Durante a inspeção da sua unidade, fique atento aos sinais de corrosão “escondida” como:

a.   Manchas de ferrugem ou descolorações do isolamento;
b.  Abaulamentos, empolamentos , estufamentos do isolamento térmico, pois  o produto de corrosão (óxido de ferro) tende a empurrar o isolamento devido  o seu aumento de volume durante a formação do óxido no aço carbono;
c.  Pequenas fugas de gotas de vapor ou odores pelo isolamento;
d.  Verifique pontos de acúmulo de umidade;
e.  Inspecione mas não toque, se você interferir num equipamento acentuadamente corroído, um vazamento pode ocorrer. Pare o sistema avaliando a classe do produto, pressão e temperatura do equipamento, antes de remover o isolamento, caso perceba corrosão significativa no ponto inspecionado.

3. Adotar técnicas de inspeção que não requeiram retirar o isolamento como radiografia ou a termografia.



Pontos quentes evidenciam muitas vezes baixa espessura.
Se sua linha for isolada e possui condições para infiltração e
conservação da umidade, suspeite da CUI.

4.  Adotar especificações de pintura ou revestimento especial adequado para as condições operacionais antes de isolar as estruturas, esta recomendação é obrigatória para materiais em aço carbono e baixa liga com risco de CUI. Para linhas em aço inox deve-se verificar se há risco de presença de cloreto, pois a falha pode torna-se catastrófica, sendo muito mais custosa do que o investimento em pintura destas estruturas “nobres”.

5.  Para tubulações isoladas apenas com intuito de proteção pessoal (temperaturas > 60°C) deve-se avaliar a adoção de outros meios de proteção como grades ou barreiras físicas ao invés de aplicar isolamento térmico.

6. Para os trabalhadores da manutenção e da construção/montagem de plantas de processo:
  • Certifique-se que a instalação esteja sempre de acordo com os procedimentos especificados. Isso inclui coberturas e vedações apropriadas do isolamento e revestimento ou pintura adequada do equipamento a ser isolado;
  • Se tiver de remover o isolamento, proteja o isolamento removido até o término do serviço e certifique-se para que ele seja adequadamente reinstalado;
  • Quando remover o isolamento para um serviço de manutenção, aproveite a oportunidade para examinar o equipamento ou tubulação. Se observar sinais de corrosão, reporte isso para a gestão para que especialistas possam inspecionar o equipamento.

Bom isolamento térmico (instalação e conservação)
minimizam a ação da CUI.


7. Para os operadores de processo:
  • Observe isolamentos danificados ou outros sinais de CUI durante suas atividades e reporte suas observações à gestão para que o isolamento danificado possa ser reparado e o equipamento inspecionado, se necessário.
  • Ao final de uma manutenção, verifique o isolamento para certificar-se que ele seja recolocado adequadamente.
  • Se danificar algum isolamento no curso de seu trabalho, registre isso e providencie para que seja reparado.

"ISTO NÃO TEM QUE ACONTECER."

Fonte:

Center for Chemical Process Safety – CCPS  
Ivo Andrei Lima do blog A Engenharia e o Conhecimento .
Explanação das aulas ministradas pelos professores Maurício de Oliveira, Luiz Antônio Bereta e Nestor Ferreira de Carvalho 
da Equipe de Formação de Inspetores – EFI / SINDIPETRO-LP.

8 comentários:

  1. COMO NO CASO DAS PERNAS DA ESFERA; PARECE QUE A CORROSÃO SE DEU POR TRINCA NO REVESTIMENTO DE CONCRETO COM INFILTRAÇÃO DE ÁGUA DA CHUVA. UM VISUAL CRITERIOSO FALTOU PARA OS INSPETORES QUE AVALIARAM SOMENTE O ASPECTO DA ESFERA APENAS.

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    1. Eu como inspetor, sempre identifico, e indico, pontos da estrutura caso necessite reparos.
      Agora o cliente não costuma se importar com isso.

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  2. O artigo está bom, porém o título deveria ser alterado. O Isolamento térmico possui as funções de conservação de energia, e acústico e proteção pessoal, nunca foi fabricado para barrar e/ou conter o processo corrosivo.

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    1. Perfeito professor Sampaio....mas o intuito é corrigir tal pensamento. Acredite... tem gente que pensa que o isolamento térmico também tem a função de proteger o equipamento contra a corrosão. O título realmente chama a atenção para esse "desvio de entendimento" e o texto enfatiza isso.
      Obrigado pela sugestão.

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  3. Muito boa essa matéria pois trata de uma causa muito comum nas plantas de todo o mundo.

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  4. CASI - Corrosão Atmosférica sob Isolamento. Fenômeno corrosivo já estudado,analisado e atacado preventivamente e exaustivamente desde os idos dos anos 90 na P.Q.U. Stº André - SP.
    Jorge Batista

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  5. Por isso que muitas empresas já utilizam Insulation Coatings. Este tipo de tecnologia já tem provas dadas no Brasil em muitos setores como Petróleo, alimentar, papel e celulose, etc. Além disso porque insistir no erro em colocar um isolamento térmico convencional que já á partida sabemos que ira dar problemas em poucos tempo? Numa altura em que todas as empresas buscam soluções com ROI e Sustentabilidade os isolamentos convencionais em temperaturas de até 157,5ºC dão problemas. Desde há alguns anos os Insulation Coatings estão a ser usados e já estão especificados por varias multinacionais e empresas nacionais.

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