domingo, 29 de dezembro de 2013

Caso 053: Improvisando...Tinha uma estrutura no meio do caminho.

A foto a seguir foi postada no dia 15/12/13 no Linkedin com o título: De quem pode ter sido o erro? Da engenharia ou produção? A foto obteve comentários diversos, com a grande maioria concordando com o absurdo de como  uma tubulação que foi montada transpassando uma coluna tubular aparentemente de função estrutural.

Algumas pessoas defenderam esta situação utilizando o termo “adequação técnica”.

Este post tem mais indagações do que conclusões já que não temos os dados operacionais, de montagem e de projeto, portanto, tem caráter mais "reflexivo ou meditativo" do que propriamente técnico.

Veja a foto a seguir, leia o texto e tire suas próprias conclusões:

Coluna tubular cortada, comprometendo a resistência mecânica,
dando passagem para uma linha 
de vácuo (cinza) ou de gás não liquefeito (amarela).

Pelo visual da foto, essa situação provocou algumas desconformidades devido às dúvidas geradas:

  1. Efetuado intervenção perigosa em uma perna estrutural, inserindo tensão na região, onde a resistência mecânica desta região ficou comprometida;
  2. Curiosamente e aparentemente, não foi feito um projeto de modificação ou de inserção de tubulação, confeccionando um novo traçado para condição apresentada;
  3. Os parafusos do flange na posição 1 hora e 5 horas foram adequadamente apertados e torqueados? A coluna interfere essa operação?
  4. Outro problema observado é a identificação fora de padrão das cores das tubulações. Afinal, a linha é de vácuo (cinza) ou de gás não liquefeito (amarela)* ?
  5. Caso essa linha precise se movimentar (dilatação e contração térmica), essa coluna pode limitar esses movimentos (flexibilidade)?
*NBR 6493/1994


Apesar das especulações elencadas acima partindo apenas de uma foto e sem os dados operacionais em mãos, o bom senso e o histórico de falhas de acidentes industriais que poderiam ser evitados, foram ignorados ou consentidos por falta de uma análise mais crítica.

Para se ter uma ideia de como uma intervenção mal sucedida em estruturas pode ser desastrosa, leia o Caso 035 (click AQUI) onde a plataforma semi-submersível Alexander Kielland, no Mar do Norte, naufraga após a instalação de um hidrofone em um dos contraventamentos tubulares.

FATO: Cerca 50% da parede tubular foi cortada, ou seja, sua resistência mecânica naquela seção caiu pela metade (ponto frágil). Somado a corrosão atmosférica que ocorrerá já que o metal foi exposto (inclusive a parede interna de todo comprimento longitudinal) e caso essa a estrutura suporte algum equipamento rotativo de grande porte, poderemos ter vibração que comprometerá ainda mais esse ponto, podendo até mesmo colapsar. Esta estrutura terá sérios problemas no futuro.

Vibração + corrosão + baixa resistência mecânica = acidente (uma questão de tempo).

SUCESSÃO DE FALHAS

É muito provável que o erro tenha como origem o projeto de tubulação, que não observou esta interferência (coluna tubular).
Salvo engano pode ter sido durante os trabalhos de topografia industrial que induziu ao erro de posicionamento durante a montagem. Se isso que aconteceu, em algum lugar uma extensão de tubo deve ter sido instalada.
Se durante a montagem o executante, juntamente com o seu encarregado, perceberam a interferência e assumiram o risco de eliminar essa interferência, sem consultar a engenharia, erraram. Acredito que isso não tenha acontecido e o executante obteve a autorização para realizar esse “serviço”.
Sendo assim, qual erro de GESTÃO permitiu esta falha: Planejamento? Comunicação? Treinamento? Supervisão?
Agora duas outras  grandes questões: Se alguém autorizou, foi feita com aval da  engenharia/projetista? Como agiu o inspetor responsável nesta situação?
Entre muitos, três  comentários sobre esse assunto no Linkedin chamam a atenção e foram  citados aqui  na integra para REFLEXÃO:

A causa é única, hoje em dia não há gestão de pessoas e sim muita indicação de pessoas, este é o maior erro. Ai podemos contar com educação de má qualidade, pessoal desinteressado e pouco comprometido, enfim uma série de fatores. Mas esse é mais um caso de puro descaso com a obra, além de danificar uma estrutura, visualmente é horrível e arriscado, pois a estrutura pode morder a tubulação. Thiago Felipe

Cuidado que o tubo verde vai morder o cinza/amarelo, rsrsrsrsr. E o setor de qualidade (inspetores de solda, dimensional, etc... ) omissos, irresponsáveis”.  Estevão Soares

Recurso técnico mais também conhecido como gambiarra. Situação muito comum em grandes obras hoje em dia e ai do inspetor que reprovar perde ate a boca”.  Jadir Gomes de Oliveira

Seria cômico se na fosse trágico. Parece-me que estamos em mais um estágio de involução:
de homo sapiens para homo gambiarrus. A sociedade vive uma crise de moral e ética?

 Mais um caso. Quem autorizou o corte de uma seção da estrutura de aço
do piperack para dar espaço para o volante da válvula?




Fonte:

Linkedin / postagem de Kleberton Douglas. De quem pode ter sido o erro? Da engenharia ou produção?

Center for Chemical Process Safety – CCPS.

domingo, 22 de dezembro de 2013

Caso 052: Explosão por Eletricidade Estática (2007).

Em 18 de abril de 2007 (11:30hs) em Araucária-PR, uma explosão seguida de incêndio ocorreu no pátio de tanques de álcool etílico da empresa IMCOPA - Importação, Exportação e Indústria de Óleos Ltda. O acidente vitimou fatalmente 4 trabalhadores e  feriu 6.

Empresa IMCOPA. A seta vermelha indica o local do acidente.

LOCAL

Obras ocorriam dentro e nas proximidades do dique de contenção dos tanques que armazenavam álcool etílico originado da soja. Os tanques eram de aço carbono revestido internamente com resina acrílica. A entrada do produto era feita pelo costado próximo ao teto e a saída pela parte inferior.
O primeiro tanque (início do acidente) será denominado aqui de TQ1 e o segundo de TQ2.

OCORRÊNCIA

Com a explosão do TQ1 que continha 10% do produto (capacidade total 311.000 litros), ocorre subitamente a ruptura do fundo (espalhamento do produto inflamável) deslocando o tanque a 20 metros de sua posição original, parando no talude do dique de contenção. Posteriormente, com a explosão do segundo tanque (TQ2) o teto é arremessado para alto e cai dentro do próprio tanque.
Assim o primeiro tanque rompeu-se na base do costado. O segundo tanque (TQ2) explodiu devido o aquecimento causado pelo primeiro incêndio, superaquecendo-o pelo produto derramado do TQ1.  O TQ2, desejavelmente, arremessou o seu teto no momento da explosão.

TQ1, o primeiro tanque que explodiu
rompendo sua base, sendo arremessado e
espalhando  todo produto inflamável.


OBS: Ao que tudo indica, no segundo tanque (TQ2), a “solda fraca” do teto atuou (condição desejável).


“Solda Fraca” – termo utilizado para indicar que a solda de fixação do teto sobre costado se romperá primeiro em caso de explosão, projetando o teto, mas  garantindo a integridade física do costado, contendo o produto no interior do tanque, impedindo o alastramento do incêndio. Ver NBR-7821 - Tanques soldados para armazenamento de petróleo e derivados (trecho específico da norma no Caso 039 - click AQUI).
Muito provável que se o TQ1 rompesse pela “solda fraca”, o incêndio não teria envolvido o TQ2.


TQ2: a explosão arremessou seu teto conservando seu produto no
interior em chamas.

Em relação às graves consequências do acidente, ou seja, as mortes e ferimentos causados aos trabalhadores, as mesmas poderiam ter sido evitadas caso o TQ1 permanecesse com seu costado intacto e contendo o álcool em chamas no seu interior.

ANÁLISE DO ACIDENTE

A saída da linha de carregamento (enchimento) do TQ1 possui um dispositivo tipo chuveiro gerando no interior do tanque uma mistura explosiva de ar e vapor de álcool. Uma fonte com energia suficiente para atingir a energia mínima de ignição poderia provocar a explosão dessa mistura.

Foram elencadas hipóteses para as possíveis fontes:
  • Descarga atmosférica: Não se verificaram evidências consistentes para essa hipótese;
  • Admissão de fonte de ignição devida a falha do corta-chama da válvula: Improvável.
  • Soldagem ou corte acetilênico que introduzissem a fonte de ignição pelo costado do tanque: Não foram levantadas evidências consistentes para essa hipótese;
  • Admissão de fonte de ignição por meio da tubulação de enchimento: Havia evidências para essa hipótese;
  • Geração de cargas eletrostáticas no interior do tanque: Verificaram-se totais condições para essa possibilidade e para a probabilidade de uma ignição provocada por eletricidade estática;
  • Fonte de ignição através de tubulação: A hipótese da fonte de ignição ter alcançado o interior do tanque por meio da tubulação pode ser admitida, uma vez que o duto poderia ter conduzido essa fonte de algum ponto remoto da linha de transferência.



A forma como era feito o carregamento do tanque, uma tubulação de entrada (dispositivo tipo chuveiro), despejando o produto em queda livre a partir do topo, criou um conhecido processo gerador de cargas eletrostáticas.

Neste caso, apesar do tanque ser construído em aço carbono, o revestimento interno com resina funcionou como isolante auxiliando no acúmulo de cargas na superfície do líquido. Se essa quantidade de carga fosse tal que pudesse gerar uma diferença de potencial em relação a alguma superfície e uma descarga com energia mínima de ignição igual ou superior à do álcool, a explosão ocorreria.

VEJAM ABAIXO OS NOTICIÁRIOS
NO DIA DO ACIDENTE.

VÍDEO 01
LOGO APÓS AS DUAS EXPLOSÕES.
Os bombeiros resfriavam um terceiro tanque.



VÍDEO 02
CORPO DE BOMBEIROS INDICA FALTA DE SEGURANÇA. SÓ PROJETO!



MEDIDAS RECOMENDADAS

1 - A operação de enchimento dos tanques deve ser feita por baixo, em vazão baixa até que a boca de entrada esteja totalmente mergulhada no produto, evitando dessa forma a descarga em queda livre, geradora de cargas eletrostáticas;
2 - O teto do tanque deve ser fixado sobre o costado com a chamada “solda frágil”, ou então ser instalada uma tampa de emergência que se rompa em caso de explosão e mantenha o costado intacto (não há obrigatoriedade de solda frágil no topo para tanques com diâmetros menores que 15 metros). Sugestão – detalhamento de solda frágil: NBR-7821 - Tanques soldados para armazenamento de petróleo e derivados;
3 – Instalar Câmaras de espuma para a injeção automática no tanque em caso de incêndio, abafando a superfície em chamas;
4 - Câmaras de inertização podem ser instaladas, injetando gás inerte (nitrogênio, por exemplo) ao invés da admissão de ar propiciada pela válvula de pressão e vácuo;
5 - Elaboração e execução (construção) do projeto seguindo rigidamente as normas técnicas aplicáveis, incluindo acompanhamento, inspeção e teste previamente á liberação do tanque para operação;
6 - Incluir no programa de Segurança, Saúde e Meio Ambiente: análises de riscos, perigos, vulnerabilidades e consequências adequadas às atividades específicas da empresa;
7 - O programa de SSMA (Segurança, Saúde e Meio Ambiente) deve também incluir etapas de treinamento, capacitação e aperfeiçoamento dos diversos níveis de profissionais envolvidos, incluindo as empresas contratadas e trabalhadores terceirizados.

Fonte:


Fernando Vieira Sobrinho e José Possebon. Relatório de Análise de Acidente – FUNDACENTRO.

terça-feira, 10 de dezembro de 2013

Caso 051: Inspeção e Montagem de Conexões Flangeadas.

Dentre vários itens de verificação que se pode citar durante a inspeção de conexões flangeadas, focaremos superficialmente dois aspectos:
  1. Subdimensionamento de estojos;
  2. Integridade física dos flanges.


SUBDIMENSIONAMENTO DE ESTOJOS

As fotos a seguir mostram conexões flangeadas incorretamente montadas, fotografadas durante inspeções de equipamentos de uma planta industrial. Nas 3 fotos inferiores, alguns ou todos os estojos são  curtos demais e as porcas não estão roscadas até o fim.








As situações mostradas acima, significam que estas conexões flangeadas podem não estar tão resistente quanto deveriam. Flanges são projetados de forma que a combinação de todos os parafusos e porcas suportem os esforços sobre eles. Se a porca estiver parcialmente roscada no estojo, a conexão poderá não ter a resistência desejada  pelo projeto.
Na foto inferior, estão faltando dois dos quatro estojos requeridos. Essa conexão flangeada estará somente com metade da resistência que o projetista intencionava!

Conexão flageada com 50% de sua resistência. Vazamento iminente?


INTEGRIDADE FÍSICA DOS FLANGES

A conexão flangeadas a esquerda está acentuadamente corroído e os parafusos estão em mal estado. Um vazamento prestes a ocorrer. Felizmente, esta condição foi observada durante uma inspeção e os flanges foram substituídos (mostrado a direita).

ANTES                                                             DEPOIS

A foto abaixo, a esquerda, mostra uma válvula de controle corroída. Você pode contar com esta válvula durante o processo? A foto abaixo, a direita, mostra a válvula substituída, que adequadamente mantida e testada, muito provavelmente funcionará quando demandada.

ANTES                                                         DEPOIS

RECOMENDAÇÕES PARA A INSPEÇÃO
  • Planeje inspeções regulares para identificar problemas de integridade mecânica – tais como equipamentos, tubulações e válvulas corroídas, suportes inadequados de tubulação, pequenos vazamentos em volta de flanges;
  • Verifique se os flanges estão corretamente montados em tubulações e equipamentos durante suas inspeções de segurança da planta. Uma regra simples a ser seguida é que todo parafuso que não ultrapasse pelo menos um fio de rosca para além da porca deverá ter sua instalação revista por uma pessoa qualificada em tubulação;
  • Caso você observe flanges conectados de forma incorreta em sua planta, informe essa situação para que ela possa ser reparada e certifique-se que os reparos tenham sido realizados;
  • Inspecione os equipamentos, mesmo que sejam novos ou que acabaram de passar por manutenção ou remontagem, para certificar-se de que estejam corretamente montados e aparafusados antes de colocá-los em operação;
  • Não espere pelas inspeções “oficiais”. Esteja constantemente alerta para sinais visuais de problemas de integridade mecânica de equipamentos;
  • Se você ver ou ouvir algo que o preocupe, avise imediatamente e acompanhe as medidas tomadas para corrigir a situação.

RECOMENDAÇÕES PARA A MONTAGEM
  • Se faz parte de seu trabalho conectar equipamentos, montagem de tubulações flangeadas, fechar flanges de acesso a equipamentos (“bocas de visita”) ou outras conexões aparafusadas de equipamentos, ou outros tipos de montagens, lembre-se que o serviço não estará completo até que todos os parafusos/estojos estejam instalados e apertados corretamente;
  • Alguns equipamentos requerem procedimentos especiais para o aperto de parafusos. Por exemplo, você poderá necessitar de um torquímetro para apertar corretamente os estojos, de acordo com a especificação, ou apertá-los em uma determinada sequência. Certifique-se de seguir o procedimento correto, usar as ferramentas apropriadas e ter recebido o treinamento adequado para estar capacitado nos procedimentos de montagem do equipamento.

MATERIAL COMPLEMENTAR INSERIDO EM 24/01/2014.

SEGURANÇA CONTRA VAZAMENTO


Situação não recomendável.
Parafuso curto.
Os parafusos em conexões flangeadas devem apresentar no mínimo 1 fio de rosca após o engajamento com a porca e não mais do que a metade do comprimento da porca.

Esta recomendação é uma “boa prática” de montagem, comum em unidades industriais, com vistas a permitir uma rápida inspeção visual do engajamento total da porca no parafuso. Evita-se assim, “subcomprimentos” que podem limitar a resistência mecânica do parafusamento da conexão flangeada. 

O ASME B31.3 em seu parágrafo 335.2.3 “Bolt Length” (comprimento do parafuso) recomenda que os parafusos se estendam completamente através das porcas. E que o “engajamento” aceitável para o caso de uma falha é de não mais do que uma rosca não engajada.

A BOA PRÁTICA

No aperto, as porcas devem ficar, no mínimo, completamente roscadas no corpo do parafuso (engajada) ou estojo. Quando se tratar de estojo, as porcas devem ficar preferencialmente a igual distância das extremidades, deixando passar, para cada lado, pelo menos no mínimo um fio de rosca e máximo de 3 fios (sendo este o valor padrão). Os parafusos já apertados devem ser identificados durante a montagem final (pintar a face exposta).

Deixar fios roscas em excesso além da porca (> 3 fios) pode provocar acidentes em locais em que haja passagens de equipes de operação e manutenção (fardamento pode ficar preso em uma situação de escape), além do maior custo envolvido. Deixar apenas um fio exposto, além da porca, dificulta a inspeção visual do engajamento total na porca. Por isto, procurasse recomendar 3 fios de rosca além da porca como uma “boa prática universal”.  


 Fonte:

Center for Chemical Process Safety – CCPS.